Há muito que não escrevo aqui, mas que melhor assunto para voltar do que economia? Pois.
O problema da economia, diria chesterton, não é ser irrazoável, é ser quase razoável. Ou seja, muitas vezes não são as respostas em economia que estão erradas - essas quase sempre são excelentes, e às vezes até fazem sentido -, mas sim as perguntas. Toda a resposta é brilhante, a pergunta é que é estúpida.
Uma jornalista coloca como lead numa notícia do Público sobre crise alimentar a seguinte pergunta: como produzir mais e desperdiçar menos? As respostas são todas razoáveis e correctas (deixem os países pobres produzir porque é mais barato, retirem as barreiras ao comércio, liberalizem os preços, deixem-se de peneirices com os transgénicos). Mas a pergunta não é. As crises alimentares nunca se dão por falta de comida, mas por falta de acesso à comida. Dah. Sim, mas deu um nobel. Há quase quinze anos o Amartya Sen ganhou-o por demonstrar que as crises alimentares aparecem quando as pessoas deixam de conseguir comprá-la ou colhê-la, ou seja, quando os seus salários, activos e produção própria não são suficientes para obter uma quantidade de comida suficiente. Por exemplo, as crises alimentares no Bangladesh no início dos anos 70 foram precedidas por aumentos record da produção de arroz. Em simultâneo, deram-se cheias em alguns meses do verão que reduziram a criação de emprego, o que reduziu os salários médios a ponto de estes já não serem suficientes para comprar comida. Mais tarde, uma economista, que não ganhou o nobel, explicou porque é que as pessoas não conseguiam comprar comida (que é a parte mais interessante), mostrando que as crises alimentares são processos longos - demoram muitos anos e consistem precisamente na redução progressiva dos preços dos activos e dos salários reais e consequente vulnerabilização - e tem associados beneficiados/derrotados. Os activos que são vendidos à pressa para poder comer são comprados por alguém a preços excepcionalmente baixos; consegue-se trabalho barato; etc. Tudo parece razoável: se nem todos comem é porque não há comida para todos. Mas a questão não é "porque é que não há comida para todos?", mas "porque é que há comida para alguns?"
E eis outra resposta razoável com uma pergunta estúpida: Paulo Teixeira Pinto disse que nunca como agora o dinheiro teve tanto poder. O dinheiro comprava poder, mas não era o poder. A pergunta estúpida é: o dinheiro compra poder? O dinheiro não compra poder, o dinheiro é poder. Claro que o dinheiro pode comprar poder: mas só porque já é poder. Ou antes: é verdade que o dinheiro compra poder, porque o dinheiro tem a função de facilitar as compras, e uma das coisas que se podem comprar é o poder. Mas o dinheiro não permite apenas facilitar as compras: o dinheiro é uma reserva de valor, e essa reserva de valor permite acumular poder. O dinheiro é trocado por poder apenas porque é poder (ninguém troca algo por outra coisa que valha menos).
O problema da economia, diria chesterton, não é ser irrazoável, é ser quase razoável. Ou seja, muitas vezes não são as respostas em economia que estão erradas - essas quase sempre são excelentes, e às vezes até fazem sentido -, mas sim as perguntas. Toda a resposta é brilhante, a pergunta é que é estúpida.
Uma jornalista coloca como lead numa notícia do Público sobre crise alimentar a seguinte pergunta: como produzir mais e desperdiçar menos? As respostas são todas razoáveis e correctas (deixem os países pobres produzir porque é mais barato, retirem as barreiras ao comércio, liberalizem os preços, deixem-se de peneirices com os transgénicos). Mas a pergunta não é. As crises alimentares nunca se dão por falta de comida, mas por falta de acesso à comida. Dah. Sim, mas deu um nobel. Há quase quinze anos o Amartya Sen ganhou-o por demonstrar que as crises alimentares aparecem quando as pessoas deixam de conseguir comprá-la ou colhê-la, ou seja, quando os seus salários, activos e produção própria não são suficientes para obter uma quantidade de comida suficiente. Por exemplo, as crises alimentares no Bangladesh no início dos anos 70 foram precedidas por aumentos record da produção de arroz. Em simultâneo, deram-se cheias em alguns meses do verão que reduziram a criação de emprego, o que reduziu os salários médios a ponto de estes já não serem suficientes para comprar comida. Mais tarde, uma economista, que não ganhou o nobel, explicou porque é que as pessoas não conseguiam comprar comida (que é a parte mais interessante), mostrando que as crises alimentares são processos longos - demoram muitos anos e consistem precisamente na redução progressiva dos preços dos activos e dos salários reais e consequente vulnerabilização - e tem associados beneficiados/derrotados. Os activos que são vendidos à pressa para poder comer são comprados por alguém a preços excepcionalmente baixos; consegue-se trabalho barato; etc. Tudo parece razoável: se nem todos comem é porque não há comida para todos. Mas a questão não é "porque é que não há comida para todos?", mas "porque é que há comida para alguns?"
E eis outra resposta razoável com uma pergunta estúpida: Paulo Teixeira Pinto disse que nunca como agora o dinheiro teve tanto poder. O dinheiro comprava poder, mas não era o poder. A pergunta estúpida é: o dinheiro compra poder? O dinheiro não compra poder, o dinheiro é poder. Claro que o dinheiro pode comprar poder: mas só porque já é poder. Ou antes: é verdade que o dinheiro compra poder, porque o dinheiro tem a função de facilitar as compras, e uma das coisas que se podem comprar é o poder. Mas o dinheiro não permite apenas facilitar as compras: o dinheiro é uma reserva de valor, e essa reserva de valor permite acumular poder. O dinheiro é trocado por poder apenas porque é poder (ninguém troca algo por outra coisa que valha menos).